Celebração
da fugacidade
Mariana Moreira » Yale Gontijo
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Espetáculo
teatral de Tadashi Endo e filme de Win Wenders reverenciam o talento da
bailarina Pina Bausch
Pina Bausch. A junção de dois nomes tão sonoros significa linguagem. Philippine Bausch nasceu em 1940 em Solingen, na Alemanha. Filha de dois comerciantes, começou a dançar ainda criança. Aos 15 anos, embrenhou-se em estudos formais que culminariam na criação de uma técnica revolucionária da dança moderna pela intensificação da encenação de espetáculos de dança-teatro. Revolucionou também a pedagogia do ensino dos movimentos cênicos. À seus bailarinos, companheiros de décadas, fazia perguntas nem sempre objetivas: “Para você, que movimento representa a alegria?”.
Desde 1972 atuou como diretora artística do Tanztheater Wupppertal, agora batizado de Tanztheater Wupppertal Pina Bausch. Reuniu em sua companhia bailarinos de vários estilos e nacionalidades. A influência de seus movimentos anda se faz sentir nos quatro cantos da dança moderna mundial. Uma das homenagens ao engenho de Pina será feita pelo dançarino japonês Tadashi Endo no espetáculo Ikiru — Um réquiem para Pina Bausch, encenado hoje e amanhã, no Teatro da Caixa. Em 23 de março, estreia no Brasil, o documentário Pina, dirigido por Wim Wenders.
Morte premente
Uma figura magra surge no palco, de camisola branca esvoaçante, gestos largos e delicados, oscilando entre angústia e melancolia, os olhos semicerrados. Mas não é Pina Bausch, em cena da clássica coreografia Café Müller, e sim o coreógrafo e bailarino Tadashi Endo, que prestou tributo a Pina e a outros mestres que o influenciaram, e já morreram. Não por acaso, ele batizou seu solo de Ikiru, que em sua língua materna, o japonês, significa vida.
O espetáculo faz rápida passagem por Brasília e será apresentado em três dias na Caixa Cultural. "Quando Pina morreu, fiquei muito chocado. Fiz uma curta versão de uma homenagem, mas não fiquei satisfeito, precisava de tempo para criar um espetáculo que iluminasse o palco, para encontrar a música adequada. Em seguida, Michael Jackson morreu. Um ano depois, Kazuo Ohno. Por essa razão, quis dizer obrigado", relata Endo, um dos mestres mundiais do butô, dança surgida no Japão após a Segunda Guerra Mundial e cultuada mundo afora. A técnica é um casamento entre influências do Oriente e do Ocidente, bebendo de fontes como o construtivismo, o expressionismo e o surrealismo. Endo mantém, na Alemanha, um centro dedicado ao ensino do butô e viaja o mundo com seus ensinamentos.
Em Ikiru, ele lança mão de elementos da dança-teatro e da tradição japonesa para celebrar o caráter perecível da existência. No palco, divide os holofotes com uma placa de alumínio, um espelho preso por um pêndulo, lembrando a passagem do tempo. Em quatro movimentos distintos (dois deles embalados pela Bachiana Nº 5, de Villa-Lobos, e pela sonoridade do tango) reproduz a passagem da vida, em encontros que passam da harmonia ao embate com o tempo. Sobre os mestres, Endo não poupa lembranças e elogios. "Pina tinha um carisma incrível, era mundialmente famosa", destaca ele, que, apesar de não ter dançado com a mestra alemã, encontrou-a por diversas vezes, situações em que falaram de dança e vida. Com Kazuo Ohno, a relação era de pai e filho. "Ele era uma espécie de xamã. Tudo o que fazia era fascinante", relembra. Em seu novo solo, mescla memórias e lições aprendidas com eles.
Homenagem em 3D
O diretor de cinema alemão Wim Wenders contava os dias para iniciar as filmagens da cinebiografia de Pina Bausch quando recebeu a notícia devastadora. Ela morreu em 30 de junho de 2009, cinco dias depois de receber o diagnóstico de câncer no pulmão e dois dias antes das filmagens do documentário Pina, concebido em três dimensões. Wenders se sentiu jogado no vazio. O filme que revelaria a intimidade da criadora perdeu seu principal personagem. Em conjunto com os dançarinos da companhia, resolveu conceber um projeto de homenagem a uma das grandes criadoras artísticas do século 20.
Em estudo meticuloso de interação cinematográfica, constrastou o peso das câmeras de captação em 3D com a leveza dos movimentos do elenco do Tanztheater Wupppertal e os depoimento destes. Todas as peças encenadas no filme foram mantidas como na montagem original concebida por Bausch. Em Brasília, o filme foi exibido para profissionais de dança da cidade e está em pré-estreia todos os dias, às 21h, no Cinemark do Shopping Pier 21.
Ikiru — um réquiem para Pina Bausch
Caixa Cultural Brasília. De hoje a domingo, espetáculo de dança encenado pelo bailarino japonês Tadashi Endo em homenagem à Pina Bausch. Sessões hoje e amanhã, às 20h; e domingo às 19h. Ingressos: R$ 20 e R$ 10 (estudantes, pessoas acima de 60 anos e doadores de 1Kg de alimento não perecível). Não recomendado para menores de 14 anos.
Pina
(Pina, França/ Alemanha/ Reino Unido, 2011, documentário, 106min; classificação indicativa livre). De Wim Wenders. Um tributo à coreógrafa alemã Pina Bausch (1940-2009), considerada uma das artistas revolucionárias da dança moderna. Cinemark Pier 11 (3D), às 22h10.
ELAS OPINAM / O que você achou do filme Pina?
“Ela era uma figura muito fechada, deu poucas entrevistas. Tudo que sabemos sobre Pina é por meio de depoimentos de quem trabalhou com ela. O filme ficou também dessa maneira por causa da morte dela. Mesmo assim, um dos pontos altos é a câmera dentro do palco, fazendo a perspectiva dos bailarinos. O espectador entra em cena. Ouvir a respiração dos dançarinos é fazer parte da companhia.”
Luciana Lara, pesquisadora, diretora e coreógrafa da companhia AntiStatusquo
“Pina herdou a genialidade de importantes nomes como Rudolf Laban e Kurt Joss. Continuou a corrente da dança expressionista alemã, transgredindo a forma de pesquisar e conceber obras coreográficas na dança-teatro. O cinema vai onde os artistas cênicos nem sempre conseguem. O contato do público com a obra de uma artista que desperta tantas sensações pode ser valioso e transformador.”
Lenora Lobo, pesquisadora e fundadora da Alaya Cia de Dança
“Sinceramente, eu esperava mais. Acho o filme lindo, a fotografia é maravilhosa e as cenas são lindas. Porém, queria ver mais a Pina como pessoa. Os bailarinos demonstram curiosidade em ter convivido com alguém que tem um grande mistério e um temperamento enigmático. Ela tem um enigma por trás dela. Mesmo assim, quem não é iniciado conseguirá captar o quanto são instigantes e provocativos os trabalhos que Pina fazia.”
Giselle Rodrigues, coreógrafa e diretora do baSiraH
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