As alianças entre dança e tecnologia A relação entre dança e tecnologia não é tão recente como parece. A coreógrafa Loie Füller estudou óptica para testar transformações das imagens do corpo já no final do século 18. Mas é depois de 1960 que os experimentos proliferam e se complexificam. Isso porque, ao contrário do que se pensa, a aliança entre dança e tecnologia vai muito além da mera documentação da dança (máquinas que registram espetáculos) ou da substituição de elementos cênicos (vídeo ou projeção digital no fundo do palco como cenário). Algumas experiências realizadas em diferentes países mostram que se trata de um processo evolutivo do corpo, acoplado a aparatos mídiaticos que transformam a si mesmos e a suas relações com os diversos ambientes. Um dos pioneiros foi o coreógrafo Merce Cunningham, que iniciou sua pesquisa com videodança e, mais tarde, passou a usar softwares para criação coreográfica. A tecnologia, no seu caso, nunca foi um meio neutro de passagem de informação, mas sim, uma parceria de criação, uma possibilidade de organização do pensamento-movimento. Mais do que uma extensão do homem, como propôs McLuhan, a tecnologia tem se tornado hoje cada vez mais parte do projeto humano existindo não apenas fora do corpo (o liquidificador como extensão da mão, o computador como prolongamento do cérebro). Na Inglaterra, por exemplo, criou-se uma rede de cientistas da computação e artistas interessados em desenvolver mídias interativas com usuários criadores (PLAN, Pervasive and Locative Arts Network). Grupos de performance como o Blast Theory, Igloo e Active Ingredient passaram a usar games e celulares, criando avatares que redesenham movimentos/mundos computadorizados. O roteiro virou programação de códigos e redes neurais que operam algoritmos metafóricos para definir comportamentos. Na maioria destes experimentos, a chave está na investigação de novos gestos e por isso a dança continua tendo um papel primordial. Em Nova York, a companhia Troika Ranch apresentou 16 (R) evolutions para desestabilizar movimentos a partir de ambientes programados combinando câmeras, o software Isadora e luz infra-vermelha com motion-capture desenvolvido pelo laboratório Genoa. O objetivo foi transformar ações em imagens midiáticas. Esses novos ambientes imersivos foram ainda mais radicalizados por experimentos como Fractal Flesh e Exoskeleton do artista Stelarc que desenvolveu uma tela de toque em interface com um Sistema de Estimulação Muscular capaz de coreografar um corpo a partir de uma série de impulsos nervosos, ativados pelos espectadores. Corinne Jola, do Instituto de Neurociência Cognitiva de Londres, e Fred Mast, de Zurique, sugeriram uma ciência experimental de dança para investigar o self neural e a mente encarnada, partindo da pesquisa do neurocientista António Damásio. Desde 2004, o projeto BrainDance e o Choreography and Cognition com o apoio do departamento de Neurociência de Cambridge, dirigido por Wayne McGregor, assim como o evento Dance and the Brain, realizado em Frankfurt por William Forsythe e Ivar Hagendoorn, têm relacionado dança e ciência para descobrir novos acionamentos corporais. E para uma espécie de medição sensória da ação e qualidade do gesto, Armando Menicacci do Mediadanse Lab em Paris, tem testado pré-movimentos na musculatura abdominal quase imperceptíveis a olho nu, discutindo como o pré-movimento é fundamental para a formação de criadores contemporâneos e em que medida a tecnologia pode interferir no processo de criação. Enquanto isso, em Grenoble, o Festival dos Imaginários aborda inúmeros trabalhos que discutem a relação entre o movimento imaginado e experiência motora. Como dá para perceber, é difícil apontar qualquer tipo de limite para estes artistas/cientistas. No Brasil, algumas destas experiências começaram a despontar em torno de 1970 com a pioneira Analívia Cordeiro e se intensificaram nos últimos dez anos, com as pesquisas de Rachel Zuanon (computador vestivel co-evolutivo), Lali Krotozinsky (dance juke box), Ivani Santana (poéticas da dança na cultura digital), Alejandro Ahmed (Projeto SKN) , entre outros. Curiosamente, ao observar estas e outras experiências, conclui-se que sendo o corpo um sistema onde se aliam natureza e cultura, para que aconteça o trânsito entre dança e tecnologia, nem é preciso usar robô, vídeo ou computador. A tecnologia cognitiva do organismo garante, de saída, pontes que, independentemente do nosso consentimento, continuam a inventar novas realidades, fictícias ou verdadeiras. | ||
Christine Greiner: Christine Greiner, professora do Departamento de Linguagens do Corpo da PUC-SP. | ||
Texto retirado do site: http://www.sesctv.org.br/revista.cfm?materia_id=11 |
sábado, 18 de junho de 2011
Ainda na onda da Dança e Tecnologia
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